quinta-feira, 10 de maio de 2012

O nazismo em 3D


Ethevaldo Siqueira, colunista do O Estado de SP

Na semana passada, aproveitei o feriadão do Dia do Trabalhador para ver e rever o magnífico documentário gravado em blu-ray disc 3D sobre a II Guerra Mundial, cujo título em inglês é 3D WWII (World War Two), produzido pelo canal de TV History HD e pela A&E Television Networks LLC, recém-lançado nos Estados Unidos. Minha primeira grande surpresa foi saber que a fotografia e o cinema com imagens tridimensionais (3D) já existiam há quase 80 anos. Nunca supus que esses avanços fossem tão antigos nem que fossem dominados pela Alemanha nazista. Quando garoto, ganhei um daqueles calidoscópios binoculares que nos proporcionavam belas imagens 3D, pela visão simultânea de um par de slides coloridos. Segundo meus pais, esses brinquedos já eram populares desde o começo do século XX.
A Alemanha dos anos 1930, acreditem, já dispunha de avançadas câmeras fotográficas e cinematográficas 3D. E o melhor de tudo é que seus registros se tornam públicos hoje graças à tecnologia digital do blu-ray 3D e contribuem para a fiel recriação de momentos dramáticos do nazismo e da II Guerra Mundial. Documentos produzidos originalmente em 3D nos anos 1930 e 1940 foram transformados há poucos meses num dos mais belos documentários de TV 3D, focalizando um período crucial do século 20, como o da escalada nazista, de seus métodos, sua violência e sua crueldade sem limites na Alemanha de Hitler.
Imagine, leitor, o privilégio de poder resgatar fatos históricos tão dramáticos, com o realismo das imagens tridimensionais, desde a ascensão de Hitler ao poder, em 1933, até o fim da II Guerra Mundial, em 1945.
Um dos pioneiros da fotografia 3D foi Heinrich Hoffman, amigo de Hitler e seu fotógrafo oficial. Espalhadas por todos os lugares da Alemanha, havia milhares de fotos do Führer feitas por Hoffman. Só a cruz suástica tinha maior visibilidade do que os retratos do ditador. Otto Schönstein, editor de livros ilustrados com fotos 3D de propaganda nazista, foi outro pioneiro desses registros com imagens tridimensionais. Os livros que publicava vinham acompanhados de visor ou óculos especiais para a observação das fotos, que podiam ser vistas aos pares, para simular o efeito tridimensional. Seus filmes de cinema 3D eram projetados em sessões especiais para oficiais das Forças Armadas, autoridades alemãs e estrangeiras e visitantes ilustres. É surpreendente que esses pioneiros tenham dominado a foto e o filme 3D, utilizando a velha tecnologia analógica dos anos 1930.
O documentário 3D WWII combina o resgate de precioso material histórico sobre a Alemanha, a França e a Segunda Guerra com depoimentos atuais de especialistas. Tudo em 3D. Martin Morgan, historiador, que foi diretor de pesquisa do Museu Nacional da Segunda Guerra, de New Orleans, de 2000 a 2008, avalia esse precioso documentário e relembra a força da propaganda nazista comandada por Joseph Goebbels em festas que exaltavam o super-homem nazista, a mulher, o operário e o jovem. Para estudiosos da história contemporânea, é muito importante rever imagens autênticas que mostram os bombardeios devastadores de Dresden, as cenas do Dia-D, da invasão da Normandia pelas forças aliadas, em junho de 1944, e, por fim, da libertação de Paris. Ou dos soldados alemães que operam canhões antiaéreos de 88 milímetros com precisão mortal.
Um momento empolgante do documentário é o das Olimpíadas de Berlim, em 1936, planejadas para exibir ao mundo o poder da nova Alemanha e a suposta superioridade da raça ariana. Vibrei ao rever as vitórias de Jesse Owens, o atleta negro norte-americano que tanta ira despertou em Hitler ao ganhar quatro medalhas de ouro. Mesmo que o leitor já tenha visto muitos filmes ou fotos daquelas Olimpíadas, creio que nada se compara aos registros em 3D do grande evento esportivo. Penso como seria útil se pudéssemos utilizar documentários como 3D WWII como material didático, nos cursos universitários de história ou mesmo de tecnologia audiovisual. Como cidadão do século 20, revi e refleti diante das imagens impressionantes e aterradoras dos congressos nazistas e desfiles monumentais de Nuremberg, os Reichsparteitagsgelände, que terminavam com discursos histéricos de Hitler para multidões de até 400 mil pessoas.
Hitler tinha grande admiração pelo Império Romano e pela cultura clássica greco-latina. Chegava a dizer que sonhava recriar uma versão moderna, nazista, do antigo Império Romano. A viagem de uma semana que faz à Itália, no começo de maio de 1938, reforça mais essa faceta megalomaníaca de sua personalidade. Em Roma, ao lado de Mussolini, ele posa como dono do mundo nas escadarias do monumento conhecido como Altare della Patria. Ao retornar da Itália, o Führer determina a um de seus mais famosos escultores, Josef Thorak, que faça estátuas majestosas que representem o “super-homem ariano alemão”. E Thorak faz. Em seguida, Hitler promove a anexação da Áustria, seu país natal, numa operação chamada de Anschluss (ligação ou contato, em alemão). A partir de 1939, invade a Polônia e deflagra a guerra que vai matar 100 milhões.
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