Publicado em 21/06/2011 às 21:17:54 hrs
Por ANTONIO CARLOS LACERDA
Infância e juventude - Último dos cinco filhos de imigrantes judeus russos que chegaram ao Brasil em 1928, Boris contraiu poliomielite quando tinha apenas um ano de vida, junto com sua irmã gêmea.
Como na época não existia vacina, a doença deixou seqüelas físicas, mas a marca maior foi a psicológica, gerada pela discriminação na infância. Até os nove anos, Boris Casoy praticamente não podia andar. Com essa idade, ele foi operado nos EUA e recuperou os movimentos. Como não podia andar, era um grande ouvinte de rádio, admirava aquele milagre da transmissão da voz.
Estudou os primeiros anos nos colégios Stanfford e Mackenzie. Foi reprovado diversas vezes no curso científico, uma vez que queria cursar o antigo clássico, em desacordo com o determinado pela família. Freqüentou o curso de Direito da Universidade Mackenzie, mas não o concluiu.
Sua vida profissional começou aos quinze anos, em 1956, trabalhando como narrador esportivo em uma emissora de rádio e como locutor na Rádio Eldorado.
A carreira - Em 1968, foi nomeado Secretário de Imprensa de Herbert Levy, Secretário de Agricultura do governo Abreu Sodré, em São Paulo, permanecendo no cargo em 1969 com a mudança do titular da pasta. Em 1970, foi assessor de imprensa de Luís Fernando Cirne Lima, Ministro de Agricultura do governo Médici. Em 1971 e 1972, foi secretário de imprensa do prefeito de São Paulo, José Carlos Figueiredo Ferraz.
Em 1974, ingressou na Folha de São Paulo, seu primeiro trabalho em jornal, onde foi editor de política e, apenas três meses depois, chegou a editor-chefe. Permaneceu no jornal até junho de 1976, quando saiu para dirigir a Escola de Comunicação e o setor cultural da FAAP.
Retornou à Folha em 1977, onde passou a escrever uma coluna sobre os bastidores políticos denominada "Painel". Em setembro, tornou-se o editor responsável pelo jornal, aos 36 anos, ficando no cargo até 1984, quando voltou a ser responsável pela coluna "Painel".
O período de Bóris como editor-chefe e diretor de redação da Folha foi marcado por grandes transformações no jornal, que consolidou a sua liderança dentro da imprensa brasileira e onde chegou a ser o colunista chefe da coluna Painel, uma das mais lidas do periódico.
Sua carreira televisiva teve início em 1961, quando atuou como repórter do programa Mosaico na TV, na TV Tupi, então o canal 4 de São Paulo, mais antigo programa ininterrupto da TV brasileira, segundo o Guiness Book, e ainda com o mesmo produtor (Francisco Gotthilf).
Em 1988, Bóris voltou para a TV, pelo Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), para apresentar o TJ Brasil, lá ficando até 1997, onde formou parcerias com as jornalistas Lilian Witte Fibe e Salete Lemos, alcançando grande popularidade. Depois, foi contratado pela Rede Record, onde trabalhou durante oito anos, apresentando o Jornal da Record até dezembro de 2005, quando foi demitido.
Bóris chegou a trabalhar na TV JB, apresentando o Telejornal do Brasil, a TV JB saiu do ar em 17 de setembro de 2007. Em 2008 foi para a Rede Bandeirantes, onde é o âncora do Jornal da Noite.
Seu estilo é muito particular, já que não se furta de emitir sua própria opinião sobre os assuntos mais polêmicos, e gosta de utilizar frases-bordão, tais como "Isto é uma vergonha" ou "É preciso passar o Brasil a limpo". Casoy foi o primeiro âncora da televisão brasileira a se basear nas experiências dos âncoras norte-americanos.
Em 1968, em reportagem sobre líderes estudantis, a revista O Cruzeiro acusou-o de ter participado do grupo CCC (Comando de Caça aos Comunistas), que combatia comunistas durante as décadas de 1960 e 1970.
Boris nega esta acusação até hoje e afirma não haver provas que comprovem sua suposta participação no CCC. Vinte anos depois, disse a respeito do episódio que tinha consciência do "quanto a imprensa pode estigmatizar alguém. Eu senti isso na carne. E não esqueço."
Em um debate na Rede Globo com os candidatos à prefeitura de São Paulo, em novembro de 1985, Boris perguntou ao então candidato pelo PMDB, Fernando Henrique Cardoso, se ele acreditava em Deus.
Fernando Henrique Cardoso não respondeu, afirmando que havia sido combinado previamente que esse assunto não seria levantado. O episódio foram fatores decisivos para a derrota de Fernando Henrique Cardoso para Jânio Quadros.
No dia 30 de dezembro de 2005, a Rede Record anunciou a rescisão de contrato com o apresentador do Jornal da Record, Boris Casoy, em comum acordo entre ambos. No entanto, Boris afirmou em várias entrevistas no decorrer de 2006 que fora demitido por motivos políticos e deixara a emissora por não concordar com as inovações do departamento de jornalismo.
Em entrevista, Boris Casoy afirmou que o PT pressionou a direção da Rede Record para tirá-lo da emissora. A emissora ficou sem os anúncios publicitários das empresas federais, incluindo as propagandas da Petrobrás.
Boris declarou que a emissora fora pressionada pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva a demiti-lo, por conta das declarações sobre os casos dos prefeitos do PT assassinados no interior do estado de São Paulo, Toninho do PT (Campinas) e Celso Daniel (Santo André) e a corrupção do governo federal.
Boris Casoy declarou à revista Istoé Gente em abril de 2006: "Esse governo pressionou a Record (para me demitir). Foram várias pressões e a final foi do Zé Dirceu. Eram três assuntos que eles não queriam nem que se tocasse: Caso Banestado (comprado pelo Banco Itaú S.A) — remessa ilegal de dinheiro para aplicações no exterior; o compadre do Lula, Roberto Teixeira [advogado da Transbrasil, acusado de operar um esquema de arrecadação de dinheiro junto a prefeituras do PT] e o assassinato do Celso Daniel. Eu insistia que acabariam em pizza. (…) Houve o telefonema do Zé Dirceu (para a Record). A diretoria me pôs a par: 'Ele disse que vai prejudicar a Record e você pessoalmente se não parar.' Essa foi a última (ameaça)… vinha uma série."
Entre abril e setembro de 2007, Boris Casoy chegou a apresentar o telejornal na TV JB, em parceria com a CNT, mas a parceria terminou conturbada.
Em 2008, Casoy foi contratado pela Rede Bandeirantes, onde apresentou, a partir de 14 de abril do mesmo ano, o Jornal da Noite. Também recebeu a incumbência de comandar a cobertura das Eleições Municipais 2008, tendo inclusive sido o âncora do primeiro debate entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo, realizado no dia 31 de julho de 2008. Atualmente, também é apresentador da BandNews FM.
Em 31 de dezembro de 2009, após uma vinheta do Jornal da Band, da Rede Bandeirantes, chamando o intervalo comercial, sem saber que o áudio ainda estava sendo transmitido, Casoy comentou em tom jocoso as imagens exibidas anteriormente, que mostravam uma dupla de garis desejando felicidades aos telespectadores da emissora.
"Que merda, dois lixeiros desejando felicidades… do alto de suas vassouras… dois lixeiros… o mais baixo da escala do trabalho…". Através da assessoria de imprensa da Band, Boris Casoy reconheceu a ofensa que cometeu contra os garis e se retratou, no dia seguinte, com os seguintes dizeres:
"Ontem, durante o intervalo do 'Jornal da Band', em um vazamento de áudio, eu disse uma frase infeliz, que ofendeu os garis. Por isso, quero pedir profundas desculpas aos garis e aos telespectadores do 'Jornal da Band'."
Em 3 de março de 2010, Boris Casoy e a Rede Bandeirantes não foram condenados por danos morais em ação movida pelo gari Marcelo Gomes de Brito, que sentiu-se ofendido pelo comentário pejorativo do âncora.
Segundo decisão do juiz Cláudio Antônio de Carvalho Xavier, a repercussão do caso deve ser considerada. No entanto, "o autor da ação não foi a pessoa diretamente atingida pela prática do ato ilícito", uma vez que o comentário de Casoy fora dirigido à categoria.
Ao jornal da AME, Boris Casoy, em 01/03/2008, falou sobre a sua deficiência. Confira:
AME – Fale-nos sobre sua deficiência.
Boris Casoy – Eu tive poliomielite com um ano de idade, logo após meu aniversário. É uma história peculiar, porque eu tenho uma irmã gêmea e nós dois pegamos a doença juntos. Isso foi em 1942, e, na época não havia nenhum tipo de vacina. Minha irmã foi acometida de uma febre muito leve e minha mãe não separou os dois nenês. Minha irmã ficou paralisada e cinco dias depois eu fui acometido pela doença. Ambos ficamos com seqüelas.
AME – Como foi sua infância?
Boris – Minha infância foi difícil. Eu praticamente não andava. Minha perna direita não se sustentava: usava um aparelho que servia de estrutura. Praticamente, tinha apenas a perna esquerda. Era vítima da incompreensão das demais crianças, recebia apelidos como mula-manca e era colocado para fora nas brincadeiras, pois não podia correr. Eu era o que chamavam de café com leite: não valia. No pegador, as crianças às vezes se deixavam ser pegas; percebia que havia tarefas facilitadas para mim, tanto pela professora, como pelos colegas. Em 1945, 46, Psicologia não era uma coisa tão difundida, não havia uma determinada orientação pedagógica para tratar com cuidado, de maneira igual, as pessoas com deficiência. A forma como me tratavam, realmente marcava. Havia também aquelas professoras que diziam: coitado desse menino. E quando me queixava para minha mãe, ela, sem poder fazer nada, chorava. E eu me sentia culpado por fazê-la chorar, deixá-la triste. Relutava em levar para ela determinadas queixas, que seriam desabafos das coisas que me aconteciam e que me chocavam. Eu percebia que era um incômodo, estorvo. Muitas vezes essas coisas ficaram caladas em meu pequeno peito infantil. Enfim, uma deficiência como a que tive sei que marca tremendamente. Provavelmente, deva ter marcas dessa deficiência até hoje. Isso foi até os 9 anos, quando minha mãe nos levou, a mim e a minha irmã, para os EUA para fazer uma cirurgia. Eu fiquei com uma perna mais fina do que a outra, mas voltei andando, mancando muito pouco, algo quase imperceptível.
AME – E a adolescência, como foi?
Boris - Após a cirurgia, aos nove anos de idade, começou, então, uma segunda etapa na minha vida, quando entrei na pré-adolescência. Foi uma espécie de ganhar o tempo perdido. Fiquei extremamente ansioso, rebelde, tive uma explosão de energia, vitalidade, vigor, como que tentando fazer tudo o que não tinha feito. Eu sentia que estava fazendo tudo o que não fazia, sentia o gosto das brincadeiras, queria curtir aquilo intensamente. Naquele momento, não gostava de mostrar minha perna, não gostava de me mostrar, as pessoas reparavam, olhavam, mas, fora isso, eu passei a me considerar normal, porque, embora mancando, passei a fazer tudo o que as demais pessoas faziam, inclusive jogar futebol. O problema, pelo menos aparentemente, estava superado. Mas sei que deixa marcas. Na medida em que ouço uma história, vejo o tema numa peça de teatro, ou em filme, ou, ainda, em campanhas de vacinação, tenho uma rememoração muito pesada. Uma doença dessas marca profundamente uma criança. Eu ainda tenho o consolo de ter me saído bem. Com 59 anos, me considero normal, mas essa doença marca muito psicologicamente.
AME – E você conseguiu superar essas marcas?
Boris – Eu não sei. Aparentemente sim, mas acho que são marcas indeléveis, não têm solução. Nunca consultei um terapeuta, um especialista. Inclusive, os tratamentos eram altamente traumatizantes, algumas vezes, imobilizantes. Engessavam as crianças, colocavam compressas muito quentes, minha mãe procurava fazer tudo que aparecia. Eram verdadeiras torturas e nos tiravam o tempo de convívio com outras crianças, tempo de brincadeira. Eu vejo um conjunto de coisas. Não são facilmente solucionáveis. Certamente minha alma está marcada, e estou contando aqui somente o que está em minha memória. Por isso quando vejo uma criança deficiente, meu sentimento é de solidariedade porque sei exatamente o que aquela criança sente, porque eu senti na própria carne.
AME – E seu lado profissional, como se desenvolveu?
Boris – Eu fiz curso de Direito, até o último ano, mas não cheguei a me formar, pois não fui buscar meu diploma. Acabei optando por atuar na área jornalística. Desde os 15 anos eu trabalho em rádio. Eu uni meu gosto por rádio ao gosto por esporte. Como não podia andar, era um grande ouvinte de rádio, admirava aquele milagre da transmissão da voz. Quando voltei dos EUA, em 1950, estava iniciando a TV Tupi e acabei me interessando muito. Trabalhei também em jornal, fui editor-chefe da Folha de São Paulo, por oito anos. Agora, estou vivendo há 12 anos uma experiência intensa com televisão.
AME – Tendo sentido na própria pele as dificuldades de um portador de deficiência, como você vê a relação da sociedade hoje com quem possui deficiência?
Boris – A visão que a sociedade tem hoje do deficiente é muito melhor do que antes. Havia dois fatores antes: a exclusão aliada a um sentimento de pena. Ou havia piedade ou pena, ou eram as duas coisas. Eu acho que hoje existe basicamente na sociedade um sentido de, primeiro, integração e, depois, criação de oportunidades. Eu me lembro quando começaram a surgir as primeiras associações voltadas para o deficiente. Já era um menino crescido, tinha 11 ou 12 anos, e me lembro disso. Eram grandes novidades no Brasil. Veio a vacinação, a maneira de encarar a doença e os deficientes mudou muito, até porque o esporte tornou os deficientes charmosos. Hoje um menino que usa bengala, alguém que sofreu um acidente de moto, hoje posa como alguém que quebrou uma perna. Quem tem deficiência nos dentes, por exemplo, hoje, já não é incômodo, pois as crianças têm até prazer em usar aparelho para corrigir a dentição. Os aparelhos de correção são bonitos, tem um certo charme, pode parecer uma bobagem, mas esse conjunto de coisas alterou comportamentos. Hoje não vejo tanta piedade, vejo muito mais que as deficiências ganharam os meios de comunicação, há campanhas em todo o Brasil. Toda mobilização comunitária que foi acontecendo, toda cidadania que vai se aperfeiçoando tem propiciado uma visão diferente. Se bem que ainda ache que pouco se concretiza em São Paulo, em termos de calçada rebaixada, escadaria que possibilite um acesso mais fácil, mas isso vai se amalgamando, vai se tornando uma conquista. Um conceito que eu sempre procuro inocular nas pessoas é o deficiente não precisa de piedade, e sim de oportunidade. Há associações que conseguem fazer que deficientes alcancem o máximo de seu rendimento.
AME – Profissionalmente, em algum momento, houve alguma dificuldade em função de sua deficiência?
Boris – Não, profissionalmente, não. Claro, eu não escolhi ser atleta. Claro que tenho limitações físicas, posso ser um atleta amador, com relativa qualidade, mas profissionalmente não, não tive nenhuma dificuldade. Há várias pessoas portadoras de deficiência que trabalham comigo e também não acho que elas sofrem piedade nem exclusão. A gente até brinca com as deficiências. Não vejo nenhum tipo de discriminação nem essa coisa da piedade. Eu acho que a piedade é um sentimento discutível. A piedade acaba sendo um instrumento de rebaixamento de quem é alvo dessa piedade, de colocação num nível de incapacidade, de incompetência. A piedade é um instrumento de exclusão. Eu acho que isso está desaparecendo. Está se formando um conceito diferente. Profissionalmente eu nunca me senti tratado diferente, discriminado.
AME – E qual é sua opinião sobre a pessoa portadora de deficiência no mercado de trabalho?
Boris – Existe uma legislação e acho que não tem sido cumprida, mas eu não vejo discriminação. Há pessoas com deficiência que são extremamente competentes. Talvez haja um certo preconceito em relação a determinadas deficiências, como a visual, por exemplo. Mas outros tipos de deficiências físicas, auditivas, por exemplo, as pessoas são tratadas normalmente. Acho que há também uma certa barreira em relação ao deficiente mental, pelas limitações, mas essas pessoas fazem muito bem suas tarefas, dentro de seus limites. As pessoas deficientes se vêm com um grande desafio pela frente e são extremamente competentes e dedicadas. Isso, porque o trabalho é prazeroso, como desafio e como exercício de vida. Essas pessoas são entusiasmadas, aplicadas no trabalho, são altamente confiáveis, até porque são curtidas, peneiradas pelo sofrimento, embora muitas vezes não aparentem, pois têm um comportamento alegre. Quem admite deficientes em sua empresa, não está fazendo generosidade nenhuma, está fazendo muito bem para sua empresa, pois quando eles têm chance são bons profissionais.
AME – Você tornou conhecida a exclamação isto é uma vergonha. Na área da deficiência, o que você considera hoje uma vergonha?
Boris – Eu não queria rotular dessa forma. Não sou um estudioso da área, sou apenas um observador. Não tenho me aprofundado, talvez até por uma falha minha em verificar o que falta. Não tenho uma visão de que algo nessa área seja uma vergonha. Eu tenho uma visão otimista neste campo. Acho que as coisas têm melhorado, com todas as dificuldades. As pessoas têm se unido. Há 20 anos, eu não imaginava que haveria uma competição entre portadores de deficiência, como as Paraolimpíadas. Nunca! São coisas que provocam uma fileira de bons acontecimentos, vão conquistando cidadania.
AME - Qual é sua mensagem para os portadores de deficiência que ainda não alcançaram esse seu otimismo?
Boris – Eu sou um otimista. A melhor mensagem que eu posso transmitir é a de esperança, mas não aquela esperança chorosa, desesperançada. É uma esperança real e alegre. Uma esperança incentivadora para as pessoas não se tornarem passivas, continuarem procurando se superar. Nessa comunidade, eu não poderia esquecer uma participação extremamente importante das mães e pais do deficiente, que têm uma tarefa de enfrentar a situação de maneira heróica, esperançosa e alegre. Sempre nas campanhas de vacinações eu tenho contado sobre minha deficiência, sempre digo que pai e mãe que não levam o filho para vacinar são criminosos. Parece apavorante, mas é para apavorar mesmo. Pais que negligenciam e não levam os filhos para vacinar são criminosos, mesmo! Agora, quem foi atingido tem que procurar reagir da melhor maneira possível, não se deprimir, não se estressar, mas elevar o máximo possível seu entusiasmo. Os pais devem transformar seus filhos em seres humanos prestantes, com amor e incentivo.
AME – E sua irmã gêmea, como vive hoje?
Boris – Minha irmã é secretária, tem netos e está muito bem, igual a mim. Na minha impressão, acho que a pólio a atingiu mais, como mulher. Ela foi mais atingida, embora as deficiências sejam parecidas, porque na adolescência eu usava calça comprida e ela, com vestido, exibia muito mais as marcas da pólio do que eu. Mas ela casou-se e é feliz. Se ela não fosse deficiente, ela teria uma vida muito parecida com a que tem hoje.
Na edição de 10/04/2006, a revista ISTOÉ Gente publicou entrevista com Boris Casoy, sob o título ‘‘Fui tratado como bandido’’. Veja, a seguir, alguns fragmentos da entrevista:
Após três meses em silêncio, o jornalista Boris Casoy diz que foi truculenta a sua demissão da Record e afirma que recebeu ameaças do ex-ministro.
Caçula de seis filhos de Isaac Casoy, dono da tradicional padaria Casoy, na rua José Paulino, em São Paulo, e da dona de casa Raissa Casoy, o paulista Boris Casoy ganhou alguns trocados na adolescência como jogador de pebolim. De ascendência russa, nunca casou ou teve filhos e fez do jornalismo o norte de sua vida.
Na Folha de S. Paulo, SBT e Record, onde trabalhou, era ouvido e recebido por presidentes da República e ministros. Nos últimos 8 anos e meio foi âncora do Jornal da Record e entoou o bordão “isso é uma vergonha” até 30 de dezembro, ao ser demitido. Após um silêncio de três meses, recuperando-se do “coice”, Boris conta as pressões políticas e as da Record que culminaram na demissão.
Ainda cobra na Justiça o que a Record lhe deve?
Sim! Eles querem ser uma grande emissora. Veja o Silvio Santos, a Globo... eles mandam alguém embora e depositam. A Record criou uma negociação que parecia uma feira de Acari: fica um tostão pra cá, um pra lá. Eu tinha 11 meses de contrato. E por contrato eles me devem o total dele: 48 meses. Eles dizem ser ilegal, mas assinaram! É grave a dificuldade que criam para me pagar!
Foi demitido porque seu jornal era engessado e não dava audiência?
Não tinha compromisso de Ibope. Era o jornal que eu me propus a fazer e nós combinamos. Mas fiquei sendo mudado de horário diariamente – todo dia não é maneira de falar. Eles tinham direito de me mandar embora, o que não podiam era querer que eu fizesse um Jornal Nacional. Eu não sei fazer o Jornal Nacional e a Globo faz Jornal Nacional melhor que qualquer um. Não quero fazer um clone! Não sei se topasse fazer um Jornal Nacional estaria na Record. Eles sabiam que eu não faria um clone, mas propuseram.
Saiu por não fazer um Jornal Nacional ou por pressões políticas?
Não sei. Formalmente é isso (não querer fazer um JN). O resto (as pressões) passa pela cabeça. Não sou bobo, mas não posso afirmar. Houve uma tentativa de me amordaçar. Mas vai acabar.
Como vê a liberdade de imprensa no governo Lula?
Esse governo pressionou a Record (para demiti-lo). Foram várias pressões e a final foi do Zé Dirceu. Eram três assuntos que eles (governo) não queriam nem que se tocasse. Caso Banestado (remessa ilegal de dinheiro para aplicações no Exterior por meio do banco), o compadre do Lula, Roberto Teixeira (advogado da Transbrasil, acusado de operar esquema de arrecadação de dinheiro junto a prefeituras do PT) e o assassinato do (ex- prefeito de Santo André) Celso Daniel. Eu insistia que acabariam em pizza.
Houve ameaça direta a você?
Não. Houve o telefonema do Zé Dirceu (para a Record). A diretoria me pôs a par: “Ele disse que vai prejudicar a Record e você pessoalmente se não parar”. Essa foi a última (ameaça)... vinha uma série. O Zé Dirceu caiu em 13 de fevereiro, meu aniversário. Depois que ele caiu, as pressões foram reduzidas. As ameaças (aconteceram) direto para o presidente da Record, que era o Dênis Munhoz.
Outro político acenou com ameaça?
Nós recebemos um relatório do diretor do escritório de Brasília da Record, que participou de uma reunião em Brasília – as emissoras acertavam questões de publicidade com o governo. Dizia: “Olha, com o Boris Casoy não dá para ter publicidade”. Me contaram ainda que o (Luiz) Gushiken (ex-secretário de Comunicação) tinha insinuado para o presidente da Record: “Com o Boris lá fica difícil o relacionamento com vocês”. Houve telefones de gente da bancada evangélica: “Olha, o Zé Dirceu reclamou. Isso atrapalha a gente”.
Do que os políticos reclamavam?
Não eram os comentários. A queixa era com a insistência no noticiário. E eu perguntava: “Qual é o ponto?”. Mas jamais o governo explicou! Uma vez noticiamos – todo mundo noticiou – o fato de 14, 15 jovens terem usado o Palácio, transportados de avião, amigos de um filho do Lula. Aí, um senador do PT me procurou e disse que o Lula tinha se ofendido, considerou invasão da privacidade. Falou: “Ele está separado do filho dele. A maneira de ter os filhos mais próximo é convidar os amigos para ficarem junto dele no Palácio nas férias”. Eu falei: “Perfeito. Só que não às minhas custas, às do País”.
Houve pressões similares no governo Fernando Henrique?
Não. Quando errávamos, ligavam o secretário de Imprensa ou o próprio presidente e nós retificávamos. Havia um diálogo democrático. Mas nenhuma pressão ou ameaça de retaliação, do tipo “vamos prejudicar”.
Com as pressões, imaginava que pudesse ser demitido?
Quando vi que a Igreja Universal fez um partido político, achei que as coisas podiam engrossar, mas não imaginava que ia ser assim. A maneira como foi feita, dia 30 de dezembro, foi truculenta. Estaria de folga no dia (era uma sexta-feira) e na segunda viajaria. Foi pensado para evitar divulgação. Sou chamado às quatro da tarde da sexta, informado que o contrato está rompido e que a Salete Lemos seria impedida de apresentar o jornal aquele dia. Durou 10 minutos. Falei: “Tá bom. Quando o sr. quer que eu pare?”. E o bispo Honorílton Gonçalves (superintendente executivo da Record): “Já. Imediatamente”. Não é soco, eu levei um coice! Fui tratado como um bandido. Me senti humilhado! Fui tratado com uma violência imerecida, como um inimigo, uma pessoa suspeita.
Verdade que foi goleiro de futebol?
Tive poliomielite, não pude andar até 9 anos. Voltei a andar com 12 e só podia jogar melhor no gol. Procurava através de exercícios compensar as deficiências. Fui goleiro do colégio, de bons times de várzea. Treinava todos os dias! Fim de semana participava de quatro jogos. Isso foi até os 20. Fui ficando mais míope. Tentei jogar de óculos, mas quebrou no primeiro jogo. Virei juiz.
Por quanto tempo?
Até a última surra! A última foi no Ibirapuera. Era uma final de congregações marianas (associações religiosas). Era uma disputa feroz, havia caminhões de torcida. No jogo, os dois capitães disseram que eu apanharia no final. Minha roupa estava atrás do gol. Pensei: “Vou perder calça, sapato”. E tinha dez minutos a mais e eu não terminava o jogo. Tinha medo! Aí, houve uma briga. Ao invés de separar, saí correndo com bola e apito e peguei um táxi. Jurei que não apitaria mais se escapasse da surra.
FONTE: ANTONIO CARLOS LACERDA é diretor do THE BRAZILIAN POST e correspondente internacional do jornal PRAVDA, de Moscou, Rússia.
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